O profissional nexialista.

01/05/2016

Num universo cada vez maior de especialização, torna-se chave contar com alguém que não necessariamente tenha as respostas para todas as perguntas, mas que saiba como buscá-las.

Na década de 1950, fez sucesso um livro chamado Voyage of the Space Beagle, escrito por A. E. Van Vogt. No Brasil, a obra foi intitulada Missão Inter Planetária. São histórias de ficção científica, em que os personagens viajam em uma nave espacial. Apesar de ter muitos cientistas a bordo, quem surgia como herói e tirava a tripulação do perigo era um passageiro chamado de nexialista, que não era especialista em nenhuma disciplina específica, mas possuía a habilidade de integrar diferentes matérias ou ciências como
psicologia, química e física. “No livro, esse passageiro era a pessoa que conseguia fazer sentido entre as várias disciplinas, os vários conhecimentos das pessoas, pegava o conhecimento de um e o conhecimento de outro, conectava e acabava por encontrar uma solução para o problema da nave”, sintetiza Zé Luiz Tavares, Chief Knowledge Officer da Nexial Tecnologia.

Assim surgiu o termo nexialismo, uma espécie de supraciência que é complementar e sequencial às várias disciplinas que compõem o conhecimento humano, de modo que as coisas e atividades façam nexo entre si. “O profissional nexialista é o cara que tem um nível de conhecimento de diversas coisas. Ele não tem a
profundidade do especialista nem é generalista que conhece muito superficialmente as coisas. Sabendo um pouco mais do que o generalista, ele consegue fazer as conexões entre as diversas áreas de conhecimento. É alguém que tem múltiplos conhecimentos, um determinado nível de profundidade que consegue conectar o conhecimento para resolver os problemas”, conceitua. Essa capacidade torna-se ainda mais importante para complementar o universo de especialização cada vez maior. “Você não precisa guardar na cabeça as coisas. A sua habilidade de processar tudo o que você vê no mundo é o que lhe confere esse perfil”, complementa.

O consultor de marketing costuma dizer que não existe nexialista júnior. “Não é possível dizer ‘agora vou ser nexialista’. É uma história de vida que você tem. Você tem que acumular um repertório de conhecimentos interessante. Em geral, o profissional que tem essa habilidade passa por vários setores dentro de uma mesma empresa ou passa por várias empresas”, define Tavares.

Exemplo nos supermercados
Dentro das empresas se reproduzem as situações imaginadas por Van Vogt na sua ficção futurista. Nem sempre o especialista é quem encontra a saída para problemas específicos, assim como os generalistas
também não conseguem resolver todas as equações. João Carlos Ligabue, atual presidente da Rede Unisuper, se encaixa neste perfil. Sempre atuou no varejo, mas passou por diversos cargos, em uma ascensão meteórica. Aos 14 anos, começou como empacotador no Nacional. Foram apenas
quatro meses na função.

Em três anos, teve três promoções: foi fiambreiro, aprendiz de chefe de loja e chefe de loja. “Tenho interesse por um pouco de tudo. Nunca fui de prestar atenção apenas na área em que eu estava trabalhando. Eu gostava de observar e fui aprendendo com os colegas de outras funções”, lembra o supermercadista.

“Creio que o varejo exige isso. São várias situações que surgem ao longo do dia, e tu tens que conhecer
um pouco de cada área para solucionar os problemas”, descreve Ligabue.

Depois de ser chefe de loja, ele alcançou o cargo de gerente operacional e mais adiante, gerente geral. Ao todo, ficou 18 anos no Nacional, e mais 2 anos no Sonae, quando o Nacional foi vendido. Em 2004, saiu para abrir uma loja com a marca Unisuper. Para se manter atualizado, o supermercadista gosta de ler sobre varejo, áreas comerciais, logística, marketing e financeiro. Almeja, quando sair da presidência,
trabalhar com logística, operações ou comercial, dentro da Rede Unisuper.

Aspectos para desenvolver
Se, por um lado, são as oportunidades, as circunstâncias e as vivências que transformam um especialista ou generalista em um nexialista, por outro, é possível trilhar passos para se aproximar deste perfil. “A grande dica é ter uma intensa curiosidade sobre tudo, é ter avidez por conhecimento. O mundo precisa cada vez mais de nexialistas para poder fazer os negócios acontecerem.

Se você acredita nisso, deve estimular o seu espírito curioso, inovador, inconformado. Mesmo que você não saiba as coisas, procurar saber é o que faz todo o sentido hoje em dia”, recomenda Tavares, coautor do livro O Marketing na Era do Nexo. As empresas, por sua vez, devem prestar mais atenção em gente com características nexialistas, tendo isso em mente ao lançar mão de estratégias de retenção de talentos.

Atenção para ficar dentro da lei
É muito bom ter uma equipe com funcionários que sabem de tudo um pouco. Mas é preciso atenção para evitar casos de acúmulo de função, que é quando o trabalhador, além de exercer sua função, exerce função de outros cargos, de forma habitual, que não foram previstas no contrato de trabalho – problema que
pode gerar processos trabalhistas.

O que as empresas podem fazer para evitar o acúmulo de função? De acordo com o advogado Paulo Tramontini, elas devem especificar claramente no contrato de trabalho quais serão as funções que o
empregado exercerá.

Publicado na Revista AGAS (maio/junho 2016)

Posted in Comportamento, Marketing
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